domingo, 15 de abril de 2007

Um texto de uma mulher que tava fazendo mestrado =D (tem umas coisas sem sentido as vezes...tentei arrumah algumas coisas no texto):

SADC: HISTÓRICO E PERSPECTIVAS ATUAIS DA INTEGRAÇÃO REGIONAL SUL-AFRICANA

Analúcia Danilevicz Pereira

Luíza Galiazzi Schneider

(UFRGS)

A integração regional, no contexto do mundo globalizado, é uma realidade cada vez mais concreta. Além disso, no mundo pós-Guerra Fria, a base teórica do liberalismo econômico torna a formação de blocos regionais um mecanismo importante de defesa e posicionamento internacional. Nesse contexto, a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC[1]) é um ator proeminente e, embora a região da África austral apresente baixos índices de desenvolvimento, sua posição é estratégica em termos geopolíticos. Se, por um lado, sua importância como ligação entre Ocidente e Oriente foi diminuída diante da abertura do Canal de Suez, fato que transformou o Mediterrâneo em um mar de trânsito, por outro lado, a região adquiriu novo papel como elo de ligação entre a América do Sul, Índia e China, se considerada a configuração de um eixo Sul-Sul. Não se pode ignorar também a relevância de suas riquezas minerais e de seus recursos energéticos. O presente artigo tem por objetivo analisar a situação atual da SADC através da observação das bases históricas da formação dessa comunidade.

Os ensejos que resultaram SADC surgiram na década de 1960. A convergência para a integração ocorreu devido ao surgimento de intensos laços de solidariedade a partir de propósitos comuns e ações coletivas contra o colonialismo e o racismo. A base teórica dessa cooperação era predominantemente econômica, embora, na prática, a motivação política não estivesse ausente. A congregação política dos estados vizinhos da África do Sul era vital, uma vez que esse país projetava-se na região não como um país aliado, mas sim, como exemplo da desunião da região à época da Guerra Fria e do apartheid.

Os dirigentes da África austral perceberam, cada vez mais, a necessidade de trabalhar em conjunto, como condição indispensável para a sobrevivência política, para o desenvolvimento econômico e para o progresso social. Através da busca de áreas de interesse comum, primeiro através da cooperação bilateral e logo mediante o agrupamento dos Estados da Linha de Frente[2], a região se converteu em um veículo para a coordenação de esforços, recursos e estratégias em apoio aos movimentos de libertação nacional, ao mesmo tempo em que resistiam às agressões do apartheid sul-africano.

Esse grupo de países reuniu-se então em Arusha, Tanzânia, em 1979, e em Lusaka, Zâmbia, em 1980, apresentando como compromisso seguir políticas dirigidas à liberalização econômica e ao desenvolvimento integrado das economias nacionais. Na Conferência de Lusaka foi criada a Conferência para Coordenação do Desenvolvimento da África Austral (SADCC). Essa organização foi essencial ao assentar as bases para a integração regional na África Austral.

Em 1989, a Conferência de Chefes de Estado e Governo, em Harare, Zimbábue, decidiu que deveria formalizar a SADCC para “dar-lhe um status adequado substituindo o memorando de Entendimento por um Acordo, Carta ou Tratado”. A Declaração e o Tratado que fundam a SADC, em substituição à SADCC, foram firmados na Conferência de Chefes de Estado e Governo, celebrada em 17 de agosto de 1992, em Windhoek, na Namíbia. A África do Sul não aderiu à organização, principalmente porque o regime do apartheid, embora prestes a ser extinto, ainda vigorava. Sendo a economia sul-africana a mais poderosa da região, havia a expectativa de que seu acesso à SADC servisse de catalisador ao desenvolvimento acelerado da região.

Anteriormente à entrada efetiva da África do Sul na organização, em 1994[3], a SADC enfrentava dificuldades. Seu pacto de defesa mútua, em realidade, obrigava os Estados membros a participar de custosas operações de paz conjuntas, como, na segunda metade dos anos 1990, exigia o conflito do Congo. O apaziguamento dos problemas internos à SADC, a adoção de sistemas multipartidários pela maioria dos membros e o fim do processo de transição para a democracia da África do Sul, assim como o fim do regime do apartheid, possibilitaram a adesão da África do Sul à SADC e a evolução da organização, apesar da percepção quase consensual, sobre a necessidade da adoção um novo modelo de crescimento orientado para o desenvolvimento.

A estrutura da SADC apresenta diversos mecanismos interessantes de fomento à cooperação regional. Entre eles, comitês e comissões subordinados aos órgãos supremos[4] que funcionam, primordialmente, para a integração de setores das economias e de regiões. Cada setor está sob a coordenação de um Estado-membro. Nos comitês e comissões existem os Pontos de Contatos Nacionais, os quais formam o nível de base dentro da estrutura da SADC e são integrados por todos os ministérios nacionais com responsabilidades vinculadas aos setores da SADC. Além disso, os Pontos de Contatos Nacionais servem de vínculo entre as instituições da Comunidade, as outras agências governamentais, a comunidade empresarial e a imprensa nacional para tudo o que se refere à SADC. Eles participam em estreita colaboração com outras unidades na formulação de políticas, estratégias e programas da organização.

A economia da África do Sul, assim como seus investidores, não só ajudou a região a atingir taxas de crescimento mais elevadas, mas também deu um maior peso à SADC aos olhos dos investidores internacionais. A economia internacional em crescimento também colabora para que, por exemplo, as economias da África Austral não sejam duramente atingidas pela crise profunda de um de seus membros, Zimbábue. A crise, aliás, até mesmo colaborou com algumas economias, que se aproveitaram de faixas de mercado deixadas pelo vizinho[5]. A diversificação das economias da SADC é essencial, principalmente a diversificação da pauta de exportações, com a inclusão de maior valor agregado a seus produtos, para que o bloco consiga alcançar índices ainda mais altos de crescimento que permitam o benefício social da população.

A SADC, portanto, retém seu caráter pertencente ao mundo em desenvolvimento. A África do Sul, sendo o mais significativo parque industrial da região, tornou-se o carro-chefe econômico da Comunidade, liderando novos investimentos e novos parceiros. Isto não significa que o país não possua graves problemas internos – econômicos, políticos, como o atual julgamento do ex-vice-presidente Jacob Zuma por corrupção, e sociais, como os elevados índices de contaminação da população pelo HIV – os quais condicionam suas ações na esfera regional e internacional. Os demais países também enfrentam problemas internos críticos, principalmente relacionados com a estrutura de suas economias, herdeiras do processo de colonização e inserção da África na economia mundial.

É importante considerar, portanto, que o sul da África é, há muito tempo, uma região em um sentido muito mais amplo que o meramente geográfico. Conforme analisaram Wallerstein e Vieira (1992), desde o século XIX, o sul da África foi um “constructo social”. No período do governo colonial, forjou-se uma economia política regional específica, com estruturas, modelos de relacionamento e instituições claramente identificáveis. A África do Sul e a maioria dos demais Estados membros da SADC foram induzidos a seguir essa política, cada um a seu próprio passo, e a participação na economia regional tornou-se fundamental para as economias internas de vários desses países. Embora, nos anos 1980, essas relações tivessem sofrido inúmeras pressões devido ao regime racista, a regionalidade fundamental do sul africano permaneceu intacta e surge, na era pós-apartheid, como um novo ator internacional atuante, o que se percebe através da análise, por exemplo, da criação do Fórum de Diálogo Índia, Brasil e África do Sul (IBAS).

Referências bibliográficas:

DAVIES, Robert. (1996) Promoting regional Integration in Southern Africa: An analysis of Prospects and Problems from a Southern African Perspective. African Security Review. 5(5): 27-38.

GUIMARÃES, Samuel P. (org.) (1996) Brasil e África do Sul. Riscos e oportunidades no tumulto da globalização. Brasília, IPRI.

LEYSENS, Anthony. (1992) South Africa’s Relations with Latin América (1966-1988). UNISA. Ocasional Paper. n 6. Centre for Latin American Studies. Johannesburg: november.

PAGE, Sheila. (1997) Some Implications of the SADC Trade Protocol. Johannesburg: Trade and Industry Policy Secretariat.

WALLERSTEIN, I. e VIEIRA, S. (1992) Historical Development of the Region in the Context of the Evolving World-System. In: VIEIRA, Sérgio; MARTIN, William; WALLERSTEIN, Immanuel. How Fast the Wind? Southern África, 1975-2000. Trenton: Africa World Press.



[1] Siglas em inglês (South African Development Community).

[2] Angola, Botswana, Lesotho, Malawi, Moçambique, Suazilândia, Tanzânia, Zâmbia e Zimbábue.

[3] Em 1994, a Namíbia também aderiu à SADC. Atualmente, são membros da Comunidade: Angola, Botswana, República Democrática do Congo, Lesoto, Madagascar, Malawi, Ilhas Maurício, Moçambique, Namíbia, África do Sul, Suazilândia, Tanzânia, Zâmbia e Zimbábue.

[4] São eles, a Conferência de Chefes de Estado e Governo e o Conselho de Ministros.

[5] Uma melhoria significativa da situação atual do Zimbábue, entretanto, aumentaria ainda mais as perspectivas positivas da SADC.